terça-feira, 30 de novembro de 2010

Pra acreditar...

Estou doente. Não é o melhor jeito de se começar um texto senão se o que se quer é deixar um tom de drama ou piedade, não é isso. Enfim, não mereço a sua compaixão, afinal, trata-se de uma mera gripe e estou assim por culpa minha. Tomei chuva por esquecer voluntariamente o guarda chuva fechado na mão direita. Que mal faria andar devagarzinho e sentir os pingos no rosto? Às vezes se paga um preço por querer voltar a ser criança.

Faltam duas provas, oito já passadas e mais quatro trabalhos vencidos em noites madrugadas, falta pouco para as férias, longos três meses dos quais não saberei o que fazer com tanto tempo e alguma dose de tédio, embora com surpresas espalhadas em pacotinhos ao longo desses dias que estão por vir.

É domingo e preciso estudar pra essa maldita prova de contratos, saber minuciosamente o mecanismo de compra e venda, da locação e ler um calhamaço de mais de cem folhas de letras não maiores que a da bula do remédio. Respiro mal, tenho preguiça, a tosse me acomete, não consigo me concentrar pra prova, quero dormir. Acordo as oito, o dia que tem que render não rende. A minha cabeça gira tal como se estivesse acabando de sair de alguma ressaca, não poderia estar pior: as olheiras denunciam o meu péssimo estado.

Já é quase onze da noite, meu corpo não agüenta mais o estudo mal feito durante o dia, abafado de mais de trinta graus. Sequer cheguei a cumprir a meta de ler as cento e cinqüenta paginas, mal passei da sessenta e três, mas consegui pensar nas mais variadas desculpas que daria ao professor por ir tão mal na prova.

É só uma nota, que mal terá? Preciso apenas de dois pontos pra passar. Não, não há mais o que fazer, a minha ultima esperança é rezar, deixar na mão de Deus.

Pensei numa solução mais próxima, Deus tinha mais com o que se preocupar. Olho para o meu pulso direito,fecho os olhos e peço para que aquilo que tinha estudado, mesmo que mulio mal, fosse o que cairia na prova e também que a minha saúde melhorasse. Fico em silencio por alguns instantes, então beijo duas vezes a pulseirinha da sorte, um para cada pedido e entrego na mão do acaso ou da sorte, que seja. Vou dormir.

De fato acordo melhor, com um pouco de tosse ainda, mas não tão enfermo como antes. Beijo o pulso pela terceira vez, agora em sinal de agradecimento pela melhora,.

Pelo menos uma coisa, mas e agora? Daqui a trinta minutos estarei sentado naquela cadeira, dura esperando a pior das hipóteses de ter que consumir mais algum tempo no estudo dessa matéria tão entendiante. Não, não há o que se remoer, pensava , agora é encarar de frente.

A prova chega, não há mais o que fazer, oito questões que me consumiriam no mínimo duas horas e quatro folhas escritas mais um pulso dolorido de tanto escrever se soubesse a matéria perguntada, ou menos de quinze minutos para preencher o cabeçalho, responder uma ou outra questão e deixar uma desculpa ao corretor da prova. Dou uma olhada na folha rapidamente, dou outra pra tentar acreditar no que acontecia. Beijo a pulseira da sorte pela quarta vez. Não era nem dez da manhã e meu dia já estava inexplicavelmente ganho.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

A partida

O novo olhar do dia ,

o passado preto e branco arrasado,

mas não descartável,

vira batido,

não sucata.


O sol de crista e coroa

vem bem intencionado.

Um corpo se livra das correntes,

Atira-se do abismo.


O futuro vem ao nosso encontro,

o tempo voa,

vira presente,

ultrapassa e passa passado.


Rasante em nosso peito é o instante,

mais uma pintura amassada,

novo papel de parede.


As malas meio abarrotadas

Deixam cair certos pertences na estrada.

Não vemos,não há tempo de recolher.

Não queremos,há dores a esconder.


Mas, percebemos algo:

As memórias ficam.


A casa está putrefata,

O trem está vindo,

Depressa!

A nave não cobra passagem,

Mas não garante viagem!


Não olhe para as águas fontes das marcas,

Mire o mastro que se levanta aos céus.

É a vela de um novo vento

Que a espera para retirar certas teias mal resolvidas.


Sopre firme, avante a novos reinos e nuvens.

Apenas não esqueça o motivo de sua ida:

Não chegue a novos ares sem saber quem fora,

Não jogue âncora à terra sem saber o porquê fugira.


Não pude embarcar em mesma nave.

Apenas peço que não se esqueça

Do meu lenço com passagens da nossa história.


Quando encontrá-la,

serão novas marcas,

novos rostos,

novos cheiros,

novos gostos,

novo cais.


Espero cruzar mesmo mastro

e hastear bandeira comum,

mas até lá ,

guardo com carinho

a pequena formosura

que fora essa aventura em versos.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Pra ver jibóias ao invés de chapéus

Hoje é dia doze de outubro, para os religiosos, dia de Nossa Senhora Aparecida, para os nem tanto ou os menores, é dia de receber presentes, dia das crianças.

Lembro que durante a minha infância costumava receber dinheiro dos meus pais. Não tinham muito tempo pra comprar presente, também não os culpo. Meu pai trabalha de segunda à sábado das oito da manhã às oito da noite e de domingo costuma ficar boa parte do dia, mamãe também o ajuda e ainda tem os afazeres domésticos.

Não posso dizer que eles não se importam comigo, ou que não me conhecem e pouco se preocupam com o que eu realmente queria. Dinheiro não trás felicidade alguma, mas o gesto de se lembrar de mim já vale muito mais que qualquer brinquedo podia me dar.

Engraçado que mesmo com dezenove anos, já quase vinte, meu pai entrou no meu quarto, enquanto eu escrevia algum e-mail, e me deixou dinheiro.

- É pra pagar o quê? – perguntei.

-Feliz dia das crianças – foi o que me disse com um sorriso no rosto

Levantei da cadeira e dei-lhe um abraço com há tempos não dava.

-Obrigado

Desconfio que meu pai talvez não saiba ao certo a minha idade, afinal, ele mal sabe a dele, como se lembraria da minha? Talvez ele ainda pense que tenho treze ou quatorze anos, mas prefiro pensar que ele ainda enxerga em mim algo de criança, o que me deixa muito feliz.

Penso que não o simples passar do tempo não é suficiente pra dizer que passamos de fase. Com doze viramos projetos de gente grande pra então com dezoito viramos adultos? Até pode ser, mas confesso que isso não trás muitas vantagens, no mais dá pra dirigir carro, tomar umas no bar.

Aliás, nunca devíamos deixar de sermos crianças, no mais, deixar de ser infantis. É necessário conservar certos sonhos simples como poder voar ficar maravilhado com o caminhar das nuvens no céu, pegar pinguinhos de chuva com a língua, comer doce até doer o dente.

Ser criança é enxergar aquilo que os adultos negam. Aquilo que dizem que a maturidade já lhes ofuscara os olhos. Não, que engano! Ser maduro nada tem a ver com deixar de ser criança, tem sim com deixar de ser infantil.

Gosto de ser bobo, deitar e rolar na grama, derrubar os outros nela, rir de bobeiras e isso tudo sem deixar de conservar certas responsabilidades.

Ok, você pode até dizer: o que um garoto de dezenove anos sabe sobre responsabilidades? Sinceramente, pouca coisa. Mas eu sei que, sabendo mais ou menos, não deixarei de ser criança, porque assim posso ver aquilo que adultos se negam a ver, porque dizem ser muito ocupados, sem tempo, mas sem saber o porquê ou pra quê de viverem numa vida frenética. Quando conseguirão parar pra ver o sol entre as nuvens e achar isso bom?

Quero ver o céu se movendo e pintá-lo de lápis de cor, quero ir até a lua e colocar algumas estrelas no bolso. Quero nunca colocar a culpa em responsabilidades quando deixar de me divertir soprando bolinhas de sabão.Quero apenas poder sempre olhar uma jibóia que engoliu um elefante quando muitos virão apenas um chapéu.

Enfim, Feliz dia das crianças a todos ;)!

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Trufas

Mamãe não é a maior fã de doces, mas, desde que abriu uma Cacau Show a 50 m de distância da ótica em que trabalha, ela sempre compra um ou outro chocolate.

A última aquisição foi um apanhado de trufas, umas 10, se não me engano.

- Tava caro, mas como eram 10 por tantos reais aproveitei a promoção.

Como se isso justificasse comprar tanto chocolate, melhor seria ser sincero e dizer que comer doces é parte da filosofia de vida ou assumir descaradamente o vício por açúcar, ou os dois ao mesmo tempo.
Peguei a trufa de torta holandesa, a qual como enquanto te escrevo neste exato momento, meu teclado com rastros de chocolate não me deixam mentir.

-Comprei esse aqui também, a moça da loja era diferente.

-É do quê?

-Dá uma olhada aí, acho que é chocolate com pimenta, se tiver coragem pode comer.

Mal sabia a minha mãe que eu já comi, não tal trufa, mas algo que era pimenta e chocolate ao mesmo tempo e não era também doce. A memória veio e me lembrei de ter me enfiado na torneira pra tirar aqueles resquícios de semente de dedo de moça da minha língua.

Deu-me certa nostalgia e uns risos, inclusive de alguém metendo goela abaixo meia garrafa d’água. A trufa continua por lá, esperando alguém corajoso. Estou com uma certa azia, não sei se é por pensar no que aconteceria se eu tivesse engolido por inteiro aquela pimenta londrinense ou se é por que eu tive três cafés da manhã hoje.

Muito embora tenha jurado não provar mais dessa combinação traumática, acho que certa saudade me fará encarar essa trufa. Talvez, terá um gosto melhor que aquele feito com chocolate alpino derretido no fogão ou no microondas, mas com certeza não terá o mesmo encanto e as mesmas risadas. Definitivamente, não é a mesma coisa.

domingo, 22 de agosto de 2010

Estação Paraíso

Quando o sorriso se assemelha mais a um ponto final,
Os olhos não miram mais longe que um palmo do nariz.
Nessas horas é preciso parar de tentar fugir dos fatos consumados
Ou ser sonhador
De tempos consumidos.
É preciso se sentar,mesmo que na calçada,
Respirar fundo
...e...
... olhar para o céu.

Os belos fios dourados tocando as pessoas percorrem distâncias inimagináveis.
As nuvens de grandeza imponente e leveza contraditória
Abrem caminho para semear os campos
enquanto o vento sussurra um canto de sensibilidade.

Nessas horas, é preciso abdicar de certas coisas.
O trabalho pode acumular.
A esposa e as contas esperar.
As responsabilidades também.
Às vezes é importante parar de pagar a conta para outros,
É preciso saldar a dívida consigo mesmo.
Às vezes é preciso se manter distante do mundo para aprender certos valores adormecidos em nossa mente apenas
Esperando
Um olhar,
Um espirro,
Um gesto patético que seja.

Não é mais hora de procurar os detalhes do mundo,
Desejar sem saber por que desejou
Ou angariar mais medalhas
Ou latões coloridos no peito.
É tempo de perceber o pequeno mundo
Dentro de um vidro poeirento chamado Eu.

domingo, 8 de agosto de 2010

Um bom-dia pra você

E a gente se encontrou antes do esperado, numa manhã dessas meio frias de Agosto das quais eu me sinto muito bem e talvez você odeie porque diz que engorda mais, mas confesso que naquela hora eu também tava odiando também, afinal, não gosto de acordar cedo, ainda mais quando o cobertor fica tão quentinho e só se deseja que te traguem chocolate quente pra você na cama.

A comemoração era um café das manhã em homenagem aos dias dos Pais na minha antiga escola de japonês. Estavam lá todos, velhos e novos alunos, um bom lugar pra por o papo em dia enquanto põe os olhos nas guloseimas da mesa. Estava olhando ao redor quando encontrei uma menina que me lembrava de certa pessoa. Avistei-a ao longe de mãos dadas com mãe e me lembrei do último encontro naquele Undokai.

- Quer ir no colo do tio Danilo?

E ela fez como que não com tanta certeza que o meu sorriso teve que ser bem encenado pra não transparecer o meu pequeno desapontamento.

Tinha, apesar desse pequeno fato, muito carinho por esta criança, a qual me dera alguns sorrisos depois como se fizesse gosto em me provocar, afinal, crianças me encantam, inclusive a sinceridade delas e esta em especial, mesmo que chutando minhas canelas como queria fazer, porque me fazia lembrar de você.

Fui dar um oi à pequenina que mexia na câmera que estava pendurada por um largo cordão no pescoço da velha professora do jardim de infância. Balançava de um lado pro outro sem se importar que aquilo era uma câmera valiosa, mas só um objeto que era divertido de ver avoando de um lado a outro.

-Olá – fiz um cafuné na cabeça e lhe estendi a mão.

Ela ergueu a cabeça com um sorriso e me disse:

- Mas você não é a minha mãe e nem meu pai!

E fiquei sem entender, enquanto ela voltava correndo para detrás das pernas da mãe, olhando-me de esguia - meio olho na calça jeans da mãe, meio olho em mim - como se estivesse não envergonhada, mas certa de que queria fazer com que eu corresse atrás dela e eu pudesse ser um amigo um pouco mais grande e brincalhão.

E nesse diálogo sem sentido, diverti-me. Encontrei-te por alguns segundos, nos olhos mesmos que vocês duas compartilham. O que me fez admirá-los por um bom bocado de segundos. Lembrei-me de que dizem por aí que os olhos são os espelhos da alma, uma marca tão forte e única que faz a beleza de cada um de nós. Lembrei-me do brilho dos seus olhos, de como eu fico desconcertado de olhar pra eles e que eu gosto deles tanto quanto das suas pintinhas-sorvete-de-flocos.

Não, não olhei pra baixo, nem desviei o olhar, perguntei-me como podia existir tamanha semelhança entre uma garota de 18 anos e uma menina de menos de 5 anos?

Uma versão menor sua, de cabelos tão escuros e pele não menos clara. Denunciava nos olhos de um modo singelo que buscava não mais e não menos que a busca incansável pela felicidade, seja nas grandes bolas de sorvete com os quais as pequeninas bochechas ficaram coradas e sorridentes naquele café da manhã, seja em andar por aí vendo borboletas passearem, ou desejando voar por aí.

Buscava a grandiosidade da vida nas pequenas coisas, até nos sorrisos e risos que dava a qualquer momento. Ah, quanta nostalgia. O que poderia eu fazer se não ficar encantado com aqueles olhinhos tão seus quanto delas, mas únicos? Seria uma irmã gêmea que nasceu anos depois? Ou a mesma pessoa dividida em dois, ou duas faces de uma mesma moeda?

Não, não há que ter explicação, nem ficar pensando muito, fiz apenas silêncio e ouvi uma serenidade brotando ao lado de uma saudade de você. Nesse pequeno silêncio, fitei firmemente os olhos dela como se fossem os seus, como se estivesse falando contigo, lembrei-me de certas coisas, da beleza e alegria com que você dizia “bons dias” - presente a todos que cruzavam seu caminho durante a caminhada matinal - e de como eu simplesmente me sentia bem andando ao seu lado.

- Bom dia, Satiko. Espero que tenha um ótimo dia - foi o que eu disse, bem baixinho pra que só você me ouvisse.

Frase esta que eu acredito que, mesmo que não tenha ouvido distante um bocado de km,foi cúmplice silencioso em um pequeno instante de felicidade que você teve no seu dia. E daí, como se fosse os votos mais sinceros, espero que faça dos passos e gestos seus motivo para outros sorrirem contigo e que você também acolha essas pequenas coisas que as pessoas do seu cotidiano te dão.

Ora, mas também não me entristecerei de todo se ao fim do dia ao deitar a cabeça no travesseiro você disser que o dia não foi tão bom assim.

Explico melhor. Penso mesmo que o “bom dia” funciona assim: pra quem diz é no mais desejar com carinho sincero que a pessoa, com seus casos e acasos, tenha toda a sorte para que faça do dia prazeroso, e pra quem ouve é a alegria de saber que alguém se importa e pensará na sua felicidade nas horas que se seguem. E se for assim, se tiver sorrido, nem que seja por um segundo, por um estalo, acredito que o meu “bom dia” terá cumprido o seu papel de fazer brotar ternura em ti.

Bom dia este tão sincero, como a sorte que a sua pulseirinha tem me dado e a qual olho com carinho sempre que algo bom me acontece, assim como é gostoso receber um bom dia seu.

A garotinha talvez ainda não entenda essas palavras que estou te dizendo, mas tenho certeza que ela gosta tanto dos “bons dias” e dos doces como você. Já está indo embora no carro junto com a irmã mais nova. Acena pra mim e diz tchau, dou-lhe um sorriso, um aceno e um outro bom-dia, agora só pra ela. Agradeci-lhe silenciosamente por ter me deixado mais perto de você por alguns segundos, feito brotar uma certa vontade de até mesmo caminhar de manhã cedo e comer mais frutas. É por isso, dentre tantos outros motivos que eu te digo:

- Definitivamente, espero que tenha um bom dia =)!

domingo, 23 de maio de 2010

Homem não pode chorar

“Homem não pode chorar” foi o que me disseram quando eu tomei um tombo feio há muito tempo atrás. Desde pequeno, sempre acreditei que se fosse pra chorar mesmo, mas um choro daqueles de fazer a garganta e olhos doerem, só quando algo muito triste acontecesse! E por muito triste eu entendia mesmo quando alguém querido morresse. Inclusive, quando via nos velórios que alguém não chorava, pensava que era porque o morto não fazia diferença alguma, ficava muito bravo.

Pra mim, chorar era um remédio pra aliviar as dores, mas daqueles que você só usa quando não agüenta mais. Daí, se a gente chorasse por qualquer coisinha, era porque a gente era fraquinho e birrento, porque precisava tomar remédio sempre. Ou porque era menininha, e menininha chora até quando o mocinho da novela morre ou quando o colega rouba o lanche do recreio. Não, menininha eu nunca fui! Homem, definitivamente, não pode chorar, não, não.

Mas hoje, estou triste como nunca estive. E choro, mas de um jeito diferente.

Minhas lágrimas não estão nos meus olhos, estão no meu sorriso encharcado, na minha boca seca, nos meus sonhos desvairados naufragados.

Caro leitor, caso queira ouvi-las, não conseguirá. Minhas lágrimas correm pra dentro surdamente, é o amargo silêncio de quem não sabe o que fazer, mas tem que fazer algo. É o peito torto mal estufado, o adeus não querido, mas, momentaneamente, necessário.

Sim, definitivamente tenho que confessar: homem chora.

domingo, 16 de maio de 2010

O domingo do meu cãozinho

Não ando lá muito bem humorado nos últimos dias, mas, ainda não cheguei ao ponto de um bom-dia dado por transeunte se tornar ofensivo ou ultrajante. Já faz quatro semanas que tenho provas e isso me dá uma pressão tremenda, ainda mais quando cada prova pede centenas de páginas a serem lidas. Definitivamente, isso não me faz bem.

O domingo veio lento e ensolarado, li meu jornal como de costume e resolvi fazer algo que há muito não fazia: levar meu cachorro pra andar por aí.
É um pequeno cãozinho preto e rechonchudo, cria de um Maltês com Poodle, não deixando de ser também um legítimo vira-lata. E lá estava ele deitado, tomando um gostoso banho de Sol quando disse:

-Vamos passear?

E logo se agitou, começou a latir, ficar empinado nas patas traseiras, a olhar para a coleirinha preta dele. Latia e apontava, como se me dissesse tal qual uma criança “Agora vamos, não?”. Às vezes, suspeito que entende o que eu falo, quem tem o seu bichinho deve me entender.

A rua vazia sem muita gente, apenas uns garotos correndo de um lado pro outro, uns velhos no bar logo cedo jogando conversa fora e umas beatas indo ou voltando da missa de domingo.

O dia bonito e não muito quente não era da atenção do meu cãozinho. Não olhava a mais de dois palmos de distância, estava sempre com o nariz apontado para o chão. Todo o ânimo estava concentrado não em ver as nuvens se movendo ou coisa que o valha, mas sim em olhar as minúcias da calçada.

Enquanto o meu passeio valia para esfriar a cabeça e me distanciar do cotidiano, o meu cãozinho queria era conhecer cada detalhe deste mundo. Investigava a calçada, postes, as saias das moças religiosas e tentava descobrir se algum colega canino por ali passara e deixara alguma mensagem. É claro que fez também questão de deixar a sua na calçada, mas logo tive de limpar para que um desavisado qualquer não pisasse no sinalzinho marrom deixado por lá. Espero que meu cãozinho me entenda e me perdoe. Não sou opressor, ou censor, longe disso. Sei que ele passa a maior parte do tempo em casa e mal tem como se comunicar mundo afora e realmente se deve aproveitar chances como essa, entretanto, preso pela sola dos sapatos alheios.

Esse pequeno passeio de uns 20 minutos valeu para deixar meu pequeno vira-lata ofegante e eu pensativo. Meu cãozinho fadigado parecia muito feliz e voltou para o seu banho de sol já com a língua tão estendida quanto o seu corpinho. Fez contato com os postes e vasos do meu bairro e não precisou olhar muito longe pra se sentir bem.

Talvez seja isso que precise. Não, calma lá. Não vou deixar qualquer tipo de vestígio nos postes ou calçadas ou cheirar o que tenha passado por lá. Acho mesmo que preciso começar a deixar essas coisas de Direito, livros, estudos, intrigas, brigas políticas um pouco de lado.

Bom mesmo é rir de bobeiras, sentar pra ver o dia passando, ou sentar pra não fazer nada sozinho ou com um bom amigo. Agora, meu cãozinho continua muito bem estirado sobre o tapete da entrada da cozinha, já entra naquilo que chamam da boa preguiça dominical, penso que eu fiz valer o dia dele, e eu como fico?.Vou aproveitar as pequenas coisas da vida hoje, os livros ficarão encostados. Quem sabe, também tomar um banho de Sol? Bom domingo a todos. Aproveitem!

domingo, 24 de janeiro de 2010

Congruência


Não cavei a minha sepultura
Mas a pá golpeia minhas costas antes da terra.
Não cavei minha cova
Mas perdi aquilo que chamam de encanto como quem perde as chaves de casa.
E sem chaves como abrirei a porta?
E então como sairei de casa?
E depois como direi quem sou ao mundo?
Mas do que adianta bravejar às ruas
Se não há ouvidos,
Se não sei quem sou,
Se não há fechadura pra ser aberta?


Não, não sinta pena de mim.
Nem desprezo.
No mais,
A doce indiferença.
Melhor,
Não sinta nada.
Tu já tens uma casa ruída,
Própria e dela não paga IPTU nem aluguel (há de se estufar o peito e minimamente se orgulhar então) ,
Mas sofre como se ainda não aprendera a andar de bicicleta,
Quem dera soubesse andar, engatinhar.


Também não quero o seu ombro, nem o seu carinho,
Pois a você,
Se te serve de consolo ao seu gracejante espírito solidário (se é que tem um),
Caro leitor,
Não sinto,
Nem sentirei a mínima compaixão por suas dores murchas e cotidianas.

Se foi Deus ou o acaso que te trouxe até minhas palavras,
Não fui porque abanei minhas linhas a torto e direito numa banca de jornal.
Se sorte ou azar,
Não sei.

Mas sei que ambos temos uma congruência
(E te abro então um sorriso meio tímido).
Somos: incertos, inconstantes, imperfeitos, in- “qualquer-coisa”
Não por opção,
Pura vocação.
Somos,
Acima de tudo,
Humanos.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Morte lenta

Entre o silêncio,
O meu respirar,
O pesar,
O adeus
A mim mesmo.

Os ponteiros falam,
As paredes chiam,
Mas eu,
Imóvel,
Extingo-me nesse vendaval
Em luto.

Tic-tac.
As horas batem
Os dias correm
E eu não me levanto do chão.

O sangue corre no meu corpo
Mas uma chaga aberta no meu peito,
Não me permite mais a mínima convulsão,
A mínima explosão por sonhar.

Restam-me
Contas a pagar
Cartas a responder
E
A minha desilusão

Tic-tac
As horas doem
O revolver me aguarda na cabeceira
Mas, pra quê apertar o gatilho
E abrir um rombo em mim
Se eu já degolei a minha vontade de viver?

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Aprendizado do dia

Conhecimento pode fazer homens grandes, mas não basta pra criar homens grandiosos.



Grandes obras, dominar povos, poder, dinheiro.



Não não...



Nada disso chega perto do que faz a compaixão do homem.