terça-feira, 24 de agosto de 2010

Trufas

Mamãe não é a maior fã de doces, mas, desde que abriu uma Cacau Show a 50 m de distância da ótica em que trabalha, ela sempre compra um ou outro chocolate.

A última aquisição foi um apanhado de trufas, umas 10, se não me engano.

- Tava caro, mas como eram 10 por tantos reais aproveitei a promoção.

Como se isso justificasse comprar tanto chocolate, melhor seria ser sincero e dizer que comer doces é parte da filosofia de vida ou assumir descaradamente o vício por açúcar, ou os dois ao mesmo tempo.
Peguei a trufa de torta holandesa, a qual como enquanto te escrevo neste exato momento, meu teclado com rastros de chocolate não me deixam mentir.

-Comprei esse aqui também, a moça da loja era diferente.

-É do quê?

-Dá uma olhada aí, acho que é chocolate com pimenta, se tiver coragem pode comer.

Mal sabia a minha mãe que eu já comi, não tal trufa, mas algo que era pimenta e chocolate ao mesmo tempo e não era também doce. A memória veio e me lembrei de ter me enfiado na torneira pra tirar aqueles resquícios de semente de dedo de moça da minha língua.

Deu-me certa nostalgia e uns risos, inclusive de alguém metendo goela abaixo meia garrafa d’água. A trufa continua por lá, esperando alguém corajoso. Estou com uma certa azia, não sei se é por pensar no que aconteceria se eu tivesse engolido por inteiro aquela pimenta londrinense ou se é por que eu tive três cafés da manhã hoje.

Muito embora tenha jurado não provar mais dessa combinação traumática, acho que certa saudade me fará encarar essa trufa. Talvez, terá um gosto melhor que aquele feito com chocolate alpino derretido no fogão ou no microondas, mas com certeza não terá o mesmo encanto e as mesmas risadas. Definitivamente, não é a mesma coisa.

domingo, 22 de agosto de 2010

Estação Paraíso

Quando o sorriso se assemelha mais a um ponto final,
Os olhos não miram mais longe que um palmo do nariz.
Nessas horas é preciso parar de tentar fugir dos fatos consumados
Ou ser sonhador
De tempos consumidos.
É preciso se sentar,mesmo que na calçada,
Respirar fundo
...e...
... olhar para o céu.

Os belos fios dourados tocando as pessoas percorrem distâncias inimagináveis.
As nuvens de grandeza imponente e leveza contraditória
Abrem caminho para semear os campos
enquanto o vento sussurra um canto de sensibilidade.

Nessas horas, é preciso abdicar de certas coisas.
O trabalho pode acumular.
A esposa e as contas esperar.
As responsabilidades também.
Às vezes é importante parar de pagar a conta para outros,
É preciso saldar a dívida consigo mesmo.
Às vezes é preciso se manter distante do mundo para aprender certos valores adormecidos em nossa mente apenas
Esperando
Um olhar,
Um espirro,
Um gesto patético que seja.

Não é mais hora de procurar os detalhes do mundo,
Desejar sem saber por que desejou
Ou angariar mais medalhas
Ou latões coloridos no peito.
É tempo de perceber o pequeno mundo
Dentro de um vidro poeirento chamado Eu.

domingo, 8 de agosto de 2010

Um bom-dia pra você

E a gente se encontrou antes do esperado, numa manhã dessas meio frias de Agosto das quais eu me sinto muito bem e talvez você odeie porque diz que engorda mais, mas confesso que naquela hora eu também tava odiando também, afinal, não gosto de acordar cedo, ainda mais quando o cobertor fica tão quentinho e só se deseja que te traguem chocolate quente pra você na cama.

A comemoração era um café das manhã em homenagem aos dias dos Pais na minha antiga escola de japonês. Estavam lá todos, velhos e novos alunos, um bom lugar pra por o papo em dia enquanto põe os olhos nas guloseimas da mesa. Estava olhando ao redor quando encontrei uma menina que me lembrava de certa pessoa. Avistei-a ao longe de mãos dadas com mãe e me lembrei do último encontro naquele Undokai.

- Quer ir no colo do tio Danilo?

E ela fez como que não com tanta certeza que o meu sorriso teve que ser bem encenado pra não transparecer o meu pequeno desapontamento.

Tinha, apesar desse pequeno fato, muito carinho por esta criança, a qual me dera alguns sorrisos depois como se fizesse gosto em me provocar, afinal, crianças me encantam, inclusive a sinceridade delas e esta em especial, mesmo que chutando minhas canelas como queria fazer, porque me fazia lembrar de você.

Fui dar um oi à pequenina que mexia na câmera que estava pendurada por um largo cordão no pescoço da velha professora do jardim de infância. Balançava de um lado pro outro sem se importar que aquilo era uma câmera valiosa, mas só um objeto que era divertido de ver avoando de um lado a outro.

-Olá – fiz um cafuné na cabeça e lhe estendi a mão.

Ela ergueu a cabeça com um sorriso e me disse:

- Mas você não é a minha mãe e nem meu pai!

E fiquei sem entender, enquanto ela voltava correndo para detrás das pernas da mãe, olhando-me de esguia - meio olho na calça jeans da mãe, meio olho em mim - como se estivesse não envergonhada, mas certa de que queria fazer com que eu corresse atrás dela e eu pudesse ser um amigo um pouco mais grande e brincalhão.

E nesse diálogo sem sentido, diverti-me. Encontrei-te por alguns segundos, nos olhos mesmos que vocês duas compartilham. O que me fez admirá-los por um bom bocado de segundos. Lembrei-me de que dizem por aí que os olhos são os espelhos da alma, uma marca tão forte e única que faz a beleza de cada um de nós. Lembrei-me do brilho dos seus olhos, de como eu fico desconcertado de olhar pra eles e que eu gosto deles tanto quanto das suas pintinhas-sorvete-de-flocos.

Não, não olhei pra baixo, nem desviei o olhar, perguntei-me como podia existir tamanha semelhança entre uma garota de 18 anos e uma menina de menos de 5 anos?

Uma versão menor sua, de cabelos tão escuros e pele não menos clara. Denunciava nos olhos de um modo singelo que buscava não mais e não menos que a busca incansável pela felicidade, seja nas grandes bolas de sorvete com os quais as pequeninas bochechas ficaram coradas e sorridentes naquele café da manhã, seja em andar por aí vendo borboletas passearem, ou desejando voar por aí.

Buscava a grandiosidade da vida nas pequenas coisas, até nos sorrisos e risos que dava a qualquer momento. Ah, quanta nostalgia. O que poderia eu fazer se não ficar encantado com aqueles olhinhos tão seus quanto delas, mas únicos? Seria uma irmã gêmea que nasceu anos depois? Ou a mesma pessoa dividida em dois, ou duas faces de uma mesma moeda?

Não, não há que ter explicação, nem ficar pensando muito, fiz apenas silêncio e ouvi uma serenidade brotando ao lado de uma saudade de você. Nesse pequeno silêncio, fitei firmemente os olhos dela como se fossem os seus, como se estivesse falando contigo, lembrei-me de certas coisas, da beleza e alegria com que você dizia “bons dias” - presente a todos que cruzavam seu caminho durante a caminhada matinal - e de como eu simplesmente me sentia bem andando ao seu lado.

- Bom dia, Satiko. Espero que tenha um ótimo dia - foi o que eu disse, bem baixinho pra que só você me ouvisse.

Frase esta que eu acredito que, mesmo que não tenha ouvido distante um bocado de km,foi cúmplice silencioso em um pequeno instante de felicidade que você teve no seu dia. E daí, como se fosse os votos mais sinceros, espero que faça dos passos e gestos seus motivo para outros sorrirem contigo e que você também acolha essas pequenas coisas que as pessoas do seu cotidiano te dão.

Ora, mas também não me entristecerei de todo se ao fim do dia ao deitar a cabeça no travesseiro você disser que o dia não foi tão bom assim.

Explico melhor. Penso mesmo que o “bom dia” funciona assim: pra quem diz é no mais desejar com carinho sincero que a pessoa, com seus casos e acasos, tenha toda a sorte para que faça do dia prazeroso, e pra quem ouve é a alegria de saber que alguém se importa e pensará na sua felicidade nas horas que se seguem. E se for assim, se tiver sorrido, nem que seja por um segundo, por um estalo, acredito que o meu “bom dia” terá cumprido o seu papel de fazer brotar ternura em ti.

Bom dia este tão sincero, como a sorte que a sua pulseirinha tem me dado e a qual olho com carinho sempre que algo bom me acontece, assim como é gostoso receber um bom dia seu.

A garotinha talvez ainda não entenda essas palavras que estou te dizendo, mas tenho certeza que ela gosta tanto dos “bons dias” e dos doces como você. Já está indo embora no carro junto com a irmã mais nova. Acena pra mim e diz tchau, dou-lhe um sorriso, um aceno e um outro bom-dia, agora só pra ela. Agradeci-lhe silenciosamente por ter me deixado mais perto de você por alguns segundos, feito brotar uma certa vontade de até mesmo caminhar de manhã cedo e comer mais frutas. É por isso, dentre tantos outros motivos que eu te digo:

- Definitivamente, espero que tenha um bom dia =)!